Diana tinha esse jeito de olhar que era mais uma paralisia. Sentava num canto que não se via, e entrava num buraco negro, um lugar que só ela ia. Dona Mirna não entendia. Uma vida inteira separava mãe e filha. Uma parecia não saber absolutamente nada da outra. Parecia.
Porque Diana sempre sabia. Parecia não olhar, mas sempre via. Tinha uma enorme presença, e uma perspicácia atroz. Olhos de lince, magnetizava, invadia. Diana, ferina e triste. Sempre arredia.
Dona Mirna desistira dela faz tempo. Desde pequena essa insistência, essa posse incondicional da própria vida. Essa independência. Parecia um radar sintonizado além do mundo. Aquela menina de olhos arregalados e cabelo em riste, sempre descalça, descabida. Só a envergonhava com os vizinhos.
Mas Diana era o avesso, não tinha jeito nem trejeito. Só aquele olhar. Naquele tempo, parecia um bicho numa jaula. Agora ia na jugular. A criança desenxabida crescera imponente e furtiva. Alta, corpulenta, nariz arrebitado, boca sedenta. De uma beleza altiva, mas mesmo assim...sempre alguma coisa que não se diz, algum desejo. Dona Mirna já teve vergonha, embaraço, desprezo. Agora só tinha medo.
Não gostava particularmente daquela hora em que o sol mudava de lugar, e abandonava a velha sala de estar, abandonava o dia. Era quando o belo rosto de Diana despertava mais pavor. Era quando Diana sorria.
***
A desgraça alheia tem mel e açúcar, é uma iguaria. E naquele dia, não foi diferente. Para onde se olhasse, amigos, vizinhos, parentes. Gente que ela nunca via.
Dona Mirna tinha os olhos cerrados, um ar de susto, de ingresia. Já não sofria. Deitada em berço esplêndido, em madeira de vime, coisa fina. E lá estava a filha de pé, a mesma altivez, o mesmo silêncio. A mesma catatonia.
Sentia os olhares, o burburinho, até os poucos passos se ouvia. Não se continham. Era a voz da romaria. Seus pensamentos fugiam, sua memória escondia. Sob os pios e os risos daquela gente. Sob o inevitável sussurro das massas: “assassina!”.
De fato, a faca, o sangue, a gritaria. Não queria entender. Tampouco explicaria. Era aquele olhar. Aquele ar de presa fácil, sempre assustada, sempre vazia. Era um vício, apenas algo que fazia. Mas não adianta explicar.
Como dizer que era a caça, o prazer, a vida, e que era só o começo?
Ninguém entenderia.
Mesmo assim, em cada gota, cada lágrima, ela sabia.
Não era morte, nem o enterro, nem a tristeza.
Era ela.
Era Diana que os atraía.
5 comentários:
A desgraça alheia é uma iguaria, sublinhado :)
E esse olhar de Diana...
Que texto denso e marvilhoso.
Como se pudesse ver Diana.
Beijos
Recebi esse texto e estou só repassando, mas concordo com o teor!
mas nao esqueça, com letrinhas ou não adoro teu blog.
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"sabe uma coisa que acho um disperdicio e um tremendo saco. São essas letrinhas de confirmação em comentarios. Isso é uma grande bobagem.
Eu faço inumeras visitas e ter que confirmar os comentarios, é demorado, é chato e atrapalha.
A vontade que dá , é nao fazer mais comentarios qdo houver necessidade de confirmar. Isso é muito irritante . E sem razão . Basta simplesmente " Moderar Comentarios" e pronto. Chega dessas letrinhas chatinhas de confirmação....isso só serve para atrapalhar visitas nos blogs de quem usa. Muitos bloqueiros amigos concordam e estão parando de visitar blogs assim."
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Tenha um ótimo final de semana.
Maurizio
O amor pode florescer
e dar frutos ou florescer
e perfumar a saudade...
Valquiria Cordeiro
BOM FDS e Beijos Meus!M@ria
molto intiresno, grazie
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