Antes de começarmos a falar sobre a personagem Abigail Williams, é bom sabermos que a personagem criada pelo dramaturgo americano Arthur Miller (1915-2005) para sua peça The Crucible (1953) foi baseada numa menina de 12 anos que viveu em Salem, Massachussets, no fim do sec. XVII. A jovem Abigail Williams foi a principal responsável pela articulação de um dos maiores julgamentos de bruxaria de que já se tem noticia. Um episódio que ficou conhecido na história americana como "O Julgamento das Bruxas de Salém".
Até hoje não se sabe com certeza como tudo começou. Há muitas teorias: uma delas, que é a que Arthur Miller usa na peça The Crucible, é a de que um grupo de meninas (entre elas, Abigail e sua prima Betty Parris, de 9 anos) se reunira na floresta à noite com a escrava dos Parris, a índia Tituba, para experimentar rituais de magia. Elas queriam, basicamente, saber o futuro - como seriam seus maridos, sua casa, seus filhos...- e também ouvir as historias macabras que Tituba contava em volta da fogueira. Mas, pouco depois, Betty Parris aparece com uma misteriosa enfermidade; em seguida, Abigail começa a ter surtos agressivos e espamos, queixando-se de dores pelo corpo e gritando palavras chulas. Sem diagnóstico de doença fisica, o médico da cidade atesta que a doença de ambas é de natureza espiritual - o que numa pequena cidade regida pelas leis da religião puritana, significa dizer que elas estariam com o demônio no corpo. Para escapar de uma punição severa por bruxaria, Betty Parris acusa Tituba de influenciá-las com magia. Nesse ínterim, outras meninas presentes na roda de magia começam a apresentar os mesmos sintomas de Abigail e Betty. Uma delas acusa duas figuras obscuras da comunidade de bruxaria. A partir daí, Abigail Williams entra em cena.
Provavelmente para dar credibilidade ao testemunho do grupo, Abigail começa a acusar membros respeitáveis da cidade de Salem de influenciarem por metodos escusos - isto é, magia negra - todas as meninas envolvidas. Verdadeiros pilares da comunidade local começam a ser investigados com base exclusivamente nas declarações de Abigail. Pesquisas históricas dão conta de que os julgamentos também tinham motivação e aproveitamento político: Abigail era sobrinha do Reverendo Parris, lider religioso de Salem - que era também um dos organizadores de uma campanha separatista que visava criar um novo município na área rural da cidade, dissociando-a do centro urbano. Quando Abigail toma frente dos depoimentos, pessoas influentes no centro urbano de Salem passam a ser desmoralizadas com acusações de bruxaria. Conscientemente ou não, Abigail se torna uma peça chave para transformar o episodio em panfletagem pró-separação.
Considerando essa ideia, a acusação de John Proctor e família faz todo sentido - John era um dos líderes daqueles que defendiam a não-separação das duas regiões de Salem. Proctor também não acreditava na "doença" das meninas - achava que isso podia ser curado com um pouco de disciplina.
Os julgamentos de Salem aconteceram entre setembro de 1692 e janeiro de 1693. O tribunal de Salem avaliou mais de 200 acusações de bruxaria, tendo condenado varias delas à prisão e à morte. Dezenove pessoas morreram na forca; outras cinco morreram na prisão enquanto aguardavam julgamento. Um dos acusados morreu torturado por se recusar a participar da propria corte. As outras foram perdoadas quando o governo de Massachusets decidiu suspender os julgamentos. E tudo por conta da palavra de uma menina, cuja motivação e veracidade jamais puderam ser verfiicados.
Não se sabe o que aconteceu a Abigail Williams depois desses eventos. Sabe-se que os Parris concordaram em se mudar de Salem, depois que ficou claro que várias acusações foram injustas, e para servir a interesses nada religiosos. Depois disso, nada. Não há qualquer outro documento fazendo a menção à Abigail Williams. Especula-se que ela teria morrido solteira e sozinha; ou ainda, que ela teria se tornado prostituta em Boston. Mas a verdade é que o desaparecimento de Abigail Williams a transformou num mito, num personagem tão forte e marcante quanto a Abigail de Arthur Miller.
CURIOSIDADES:
1) A Abigail Williams historica tinha 12 anos; Para servir ao enredo criado para The Crucible, Miller a transformou numa bela jovem de 18 anos.
2) A relação excusa entre Abigail Williams e Jonh Proctor foi criada exclusivamente para a peça. Não há qualquer evidência histórica que comprove que Abigail e Proctor se conheciam. Abigail morava no campo e Proctor tinha uma taberna na cidade. Eles moravam a mais de 8 km de distancia um do outro - o que em 1692 era algo dificil de percorrer.
3) o John Proctor histórico tinha 61 anos; para a peça, Miller o transformou num homem de 30 anos. A esposa de Proctor, Elizabeth, estava grávida na época dos julgamentos e por isso escapou da morte - na vida real e na peça - sendo condenada à prisão perpétua.
5) O juiz que presidiu os julgamentos em Salem chamava-se John Hathorne - que vem a ser bisavô do escritor Nathaniel Hawthorne, autor do livro A Letra Escalarte, cuja protagonista Hester Prynne já deitou no divã deste blog. A letra "w" no sobrenome Hathorne foi acrescentada pelo escritor para desvinculá-lo da figura do carrasco de Salem. Será só coincidencia que a história de Hester Prynne tenha sido ambientada justamente na America Puritana no sec. XVII?
6) A peça de Arthur Miller ganhou uma versão para o cinema em 1996, que no Brasil ganhou o título de "As Bruxas de Salém", com Winona Rider no papel de Abigail Williams e Daniel Day-Lewis no papel de John Proctor. O roteiro do filme foi escrito pelo proprio Arthur Miller.
No proximo post, vamos deitar a Abigail Williams de Arthur Miller no divã do nosso blog. Aguardem...
3 comentários:
Que blog lindo... quanta arte!
Um abraço.
Obrigada, volte sempre!
Parabéns pelo ótimo blog! Adorei e estou saboreando as postagens!
Sou estudante de Letras pela Universidade do Sagrado Coração e também tenho um blog, se quiser visitar: lahordani.blogspot.com
Beijos e mais uma vez parabéns!
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